terça-feira, 31 de julho de 2007

Carta a Valentine

V

Viver... depois que perdi literalmente o sentido da palavra, Valentine, queres, insistentemente, que eu te explique o que é viver? Após estes fatídicos acontecimentos me perguntar sobre isso é como perguntar a um viajante perdido por que caminho agora ele deve seguir! Se me preocupo contigo, ou seja, com a tua reputação, isto não significa que questiono o teu estilo de vida... apenas não compreendo o fato de nutrires tão abundante amor que instigue tais cortesãs a não só gozarem dele, como a partilharem entre si o que nele há de mais puro! Se amar uma só mulher é, como dizes, uma lei nascida de podres ventres e de um instinto de conservação fugaz e falso, pretendo com ela assim morrer, amigo, enquanto não encontrar no mundo uma alma capaz de preencher este enorme vazio que Lohraine deixou... como vês, não há nada que me faça apartar desta minha santa e quiçá insana obstinação - algo que raramente vejo em ti। Ontem mesmo avistei Lohraine próximo ao parque Duvert; conversamos um pouco... ela me perguntou de ti... sua alma aparentava uma ligeira inquietude quando às vezes dizia o teu nome... não sei ainda dizer se é amor o que ela sente - não quero te dar esperanças -, mas é um mistério que provavelmente envolve uma certa afeição... talvez a distância ou quem sabe aquele sentimento de perda, aquele sentimento (egoísta) de possessão, típico de algumas mulheres, tenha aflorado repentinamente por estares na Corte, rodeado das mais ilustres beldades... em tudo isso, amigo, o que mais temo é que, devido às circunstâncias, ela perca de vez a confiança na sincera devoção que lhe revelas - escrevo não como um falso moralista, mas como um amigo que deseja recobrar na tua felicidade o sentido real daquilo que jamais te poderá explicar... Saudações cordiais.

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